terça-feira, 18 de novembro de 2008

Boa fé na homofobia

Como vou explicar ao meu filho de sete anos o que ele estava vendo?  telespectadora enraivecida pela exibição de um beijo homossexual em um seriado norte-americano

Eles [os gays] podem se beijar no banco da igreja e o padre não pode dizer nada – senador Magno Malta (PR-ES), em discurso no plenário do Senado


O projeto de lei 122/2006 tem assustado algumas pessoas, e alegrado outras. Para quem não conhece, trata-se da tão falada "lei da homofobia", que veta judicialmente a discriminação aos homossexuais. São tantos os argumentos de que padres e pastores não poderão impedir que casais gays se beijem em templos religiosos (como se o beijo entre homens e mulheres fosse liberadíssimo nesses ambientes) que chega a soar patético. O senador e pastor evangélico Magno Malta (foto), em discurso no Senado, afirma que homossexuais poderão estar transando embaixo de janelas e não poderemos dizer “aqui é o meu condomínio e aquelas são as minhas crianças, por favor”. Imagino que se o ato sexual se realizasse entre um homem e uma mulher, logo não haveria problema...


Mas haveria sim. De acordo com o artigo 233 do Código Penal, praticar ato obsceno em lugar público é crime, e o infrator pode ficar preso por um período de três meses a um ano, além da possibilidade de multas. Se houvesse uma leitura minuciosa do projeto de lei, talvez até os mais ferrenhos opositores à atualização legislativa veriam que o objetivo principal é coibir as atitudes mais violentas, como agressões e linchamento, além das diversas expressões homofóbicas. No fundo, é como se os adversários à implantação do projeto defendessem o direito à discriminação. Se for este o caso, vamos analisá-lo.

Por que não se pode discriminar alguém por sua orientação sexual? A resposta é a mesma caso a indagação trouxesse o vocábulo “política” em vez de “sexual.” Se eu fosse racista, membro da Ku Klux Klan, é claro que diria que a Constituição agride meus princípios. Acharia um absurdo topar com negros pelas ruas e conviver com eles, mas eu não poderia insultá-los, agredi-los ou causá-los constrangimento devido à cor da pele. Porque eu seria preso, submetido à legislação vigente, o que faz algum sentido para quem vive sob a égide da democracia. Na verdade, a questão ultrapassa princípios democráticos: ela trata de tolerância, de respeito aos direitos humanos.

Um argumento muito utilizado por quem contradiz o projeto de lei 122 é de que ele fere o direito de expressão. E fere mesmo. Da expressão homofóbica, discriminatória e semeadora de manifestações de ódio. Os críticos ao projeto parecem não ver que atos de violência começam bem aí, no esforço em tratar o outro como diferente, inferior e não digno. Afinal, quais os argumentos que nazistas utilizaram para justificar a segregação e a matança dos judeus? Um deles pode ser: “São seres inferiores, que não merecem integrar a sociedade”. A opinião de alguns pastores em relação ao homossexualismo não é muito diferente.

Falando nisso, era só eu ou mais alguém pensava que o Estado deveria ser laico? Essa discussão sobre criminalização da homofobia faz surgir outra, acerca da influência das esferas religiosas na política.

É por essas e outras que, caso tivesse de escolher entre (1) meu filho observar um beijo entre dois homens ou (2) assistir a um culto religioso que apregoa discriminação, teria orgulho em optar pelo primeiro caso.

14 comentários:

Camila disse...

Brilhante!
Optaria pelo mesmo que você, sem titubear.
Inclusive, preferia que meu filho assistisse a um beijo homossexual a que assistisse a QUALQUER culto religioso...

Camila disse...

Camila, não seja tão extremista... Você está sendo preconceituosa com as religiões =P. Não são todas horríveis assim e, em geral, a religião prega princípios básicos muito bons. Não sou muito religiosa e não pratico a minha religião, mas gosto de pensar que sem ela eu poderia ser outra pessoa não tão boa XD.
Enfim, entre as opções estabelecidas, eu deixaria meu filho(a) ver o beijo também. Mass, desde que não fosse em uma novela da Globo. Se fosse algo espontâneo da vida cotidiana de um casal que realmente existe e não uma dramatização para conseguir aliados à causa homossexual.
Sem descriminação, mas sem “rasgação de seda” também. Bem como não concordo com os temas do racismo e da deficiência física na TV.

Sei lá, esse tema é muito difícil.

Gostei do blog, Paulo.
Beijos!

Wendy

Anônimo disse...

Tal qual a concepção de um deus, a homofobia também em nada acrescenta a uma sociedade esclarecida. Definitivamente, não precisamos de mais homófobos na exata proporção em que também dispensamos religiosos.

Lorena Piñeiro disse...

Não poderia concordar mais com você, Paulo.
Ótimo texto :)

Leonardo Nascimento da SIlva disse...

Complicado isso, Paulo. Também sou contra o preconceito. Mas, ao que me parece, grande parte das pessoas que se declaram contra o preconceito, por vezes, são as mais preconceituosas. Ter preconceito em relação às pessoas quem o tem, não deixa de ser preconceito.

Não acho digno que líderes religiosos ou qualquer outra pessoa, no auge da sua arrogância e egocentrismo, pensem sobre si e ajam a partir de uma visão de superioridade em relação às demais. Mas, não se pode dizer que pessoas que têm uma visão diferenciada, nesse caso em questão, sejam homofóbicas. Ninguém é obrigado a aceitar certas coisas, desde que não infrinja o direito das outras. Por isso, não vejo como problema que um líder religioso impeça que homossexuais se beijem em templos, no caso de essa atitude não estar ligada ao que o grupo em questão acredita. Até porque, aquele espaço é para reunião dos que compartilham tal ideologia!

As pessoas têm crenças. Acho infudada a visão daqueles que se declaram como intelectuais querer que elas deixem de ter. Por quê? O discurso em questão é que os ditos religiosos não são os donos da verdade. Os intelectuais são?

Não me declaro religioso, porque religião, para mim, é algo humano e dogmático. Mas acreidto em DEUS e em princípios espirituais, e tenho uma visão fundamentada nisso. Tento não ter preconceito em relação às pessoas. Cada um faz, ou não, aquilo que acha melhor, dentro de regras estabelecidas social e culturalmente. Mas isso não significa que eu seja OBRIGADO a mudar o que eu acredito. Ou estou enganado?

Concordo que o preconceito exacerbado tem que acabar. E até sei que o seu post não foi exatamente contra a religião, e, sim, contra o preconceito. Fiquei "chocado" (Rs!) foi com o comentário da Camila!

Resumo do meu comentário (Rs!): as pessoas têm direito a não ver tudo com os mesmos olhos das outras. As pessoas não têm é o direito de desrespeitar as demais.

Anônimo disse...

Quanto ao "beijo no templo": foi uma metáfora, bem como uma resposta ao discurso de Magno Malta. Até parece que os gays vão sair beijando dentro de igrejas só para aparecer...

Infelizmente, tal qual a discriminação racial, caso o plc 122 seja aprovado muita coisa ficará só na teoria/leis, sem aplicação. Há quase 20 anos da promulgação da lei do racismo, veja que ele ainda permanece como tema atual. Quantos casos conhecemos no dia-a-dia, seja através da mídia ou de conhecidos?

Concordo em pontos e vírgulas com o seu último parágrafo, Léo. Foi essa exatamente a mensagem que tentei passar.

Sabemos que discordar é uma coisa, discriminar e apedrejar é outra.

Camila disse...

Gente, não se choquem com o meu comentário. rs..
Sim, sou uma ateísta convicta. Também concordo que as religiões tragam bons princípios básicos, mas sem esquecer que elas também trazem conceitos bem ruins. Ao se assistir a um culto religioso qualquer, algumas coisas são pregadas em detrimento de outras, isso é certo. TODAS as religiões ao mesmo tempo em que pregam coisas "boas", pregam coisas "ruins".
Eu queria mesmo era que as pessoas se respeitassem independentemente das religiões. O ideal seria que todos nós vivêssemos com ética e civilizadamente, sem levar em conta que esses são princípios bem vistos por Deus ou não.
Por isso, acho que o Caetano Veloso foi extremamente feliz quando disse que um dos mais importantes passos para o Brasil crescer como país é em direção ao ateísmo.
O ateísmo traz boas condutas, sem esperar nada em troca. Não é preciso acreditar que se "faz o bem" porque Deus assim o quis. É preciso, sim, fazer as coisas de modo a viver e deixar os outros viverem, e Deus não tem nada a ver com isso.

Anônimo disse...

Se em lugar de uma bíblia sagrada fosse dado algo de Dostoievski para uma criança ler, aí sim o mundo poderia, quem sabe, ser coisa melhor.
Aliás, só en passant mesmo, leiam II Reis, cap. 2, ciclo de Eliseu, vers. 23, "os meninos de Betel". Esse Javé não odeia só os homossexuais, mas também as criancinhas, to até virando fã do profeta Eliseu, viva Eliseu, meu ídolo bíblico desde agora e para sempre. Amém.

Vinícius Lisbôa disse...

Não sou nem um pouco a favor de se respeitar a opinião de homofóbicos. Ser tolerante com a intolerância só faz ela aumentar. As pessoas que são contra a lei da homofobia lutam pelo seu "sagrado" direito de ter preconceito, como bem disse o Paulo.

Só faço uma ressalva à lei. Ouvi sacerdotes extremistas dizerem que, com a aprovação da proposta, padres e pastores seriam obrigados a realizar casamentos homossexuais nas igrejas, o que, particularmente, sou contra. Já no civil, não vejo razão para que ainda não se tenha liberado, já que o Estado é "laico".

Leonardo Nascimento da SIlva disse...

Vinícius, não sei se a sua resposta foi relacionda a mim.
Enfim, não falei nada sobre respeitar a opinião de homofóbicos, pelo contrário. Só não acho que ver as coisas por outro ângulo se caracterize como homofobia.

Paulo, não seja tão otimista. É óbvio que nem todos teriam a imbecil idéia de ir à igreja trocar beijos, outros fariam questão, acredite!

Camila, hoje eu acredito em Deus e não faço o bem só e somente só por isso. Sempre fui ateu e sempre procurei viver bem com todos.
Sei que você é ateísta. Mas lembre-se da antropologia! uahuhauha

Eduardo, eu leio a Bíblia e Dostoievski. Acredite, não é tão impossível isso! huauhahua
Além do mais, independente de você acreditar ou não - sem falar que acho meio ridículo ficar parecendo que quero dar aulas de catecismo aqui (Rs!)- já li II Reis pelo menos 10 vezes. As coisas não são bem assim, não. Esse Javé não odeia os homossexuais, mas o homossexualismo. Nem odeia as criancinhas! O erro foi de Eliseu, que usou da autoridade espiritual que tinha e cometeu tamanha atrocidade. A questão aqui não é afirmar nada, só mostrar como as coisas estão escritas!

Abraços, galera!

O blog do Paulo tá bombando, hein! uhahua

Anônimo disse...

Léo, mesmo que eles beijem (e acreditando piamente que é improvável), as coisas estão de um jeito que os ganhos seriam infinitamente superiores.

E, Léo, não, ver as coisas de outro ânuglo não virará homofobia. Vejo tantas pessoas, principalmente pastores, dizendo que se discordarem do homossexualismo serão punidos. Peço às pessoas que compartilham desse argumento que escrevam ao pé da letra esse tal discurso discordante-que-não-poderá-mais-ser-feito; exemplifiquem-no.

Sim, está o blog indo bem.

Até a próxima.

Anônimo disse...

"(...)nem os devassos, nem os idólatras, nem os adúlteros, nem os efeminados, nem os sodomitas, nem os ladrões, nem os avarentos, nem os bêbedos, nem os maldizentes, nem os roubadores herdarão o reino de Deus" (I Coríntios, 6:9)

Tomando-se por efeminados uma parcela dos homossexuais, sim, Javé não gosta deles (dos homossexuais mesmo, caro Leonardo, não do homossexualismo, mostrando "as coisas como estão escritas") e inda os compara a seres socialmente indesejáveis.

Inda assim, assumindo-se que tivesse algum fundamento seu comentário anterior, que é o homossexualismo sem haver quem o manifeste, isto é, os homossexuais? Ora, a ira sobre qualquer atitude recai, a priori, sobre o ser agente, não?

Quanto ao profeta Eliseu - que, tal qual Bozo, o palhaço, odeia mesmo as criancinhas gozadoras de carecas -, aí vai a reação de Javé a algo tecnicamente incorreto:

"E o Senhor disse a Moisés e a Arão: Porquanto não me crestes a mim, para me santificar diante dos filhos de Israel, por isso não metereis esta congregação na terra que lhes tenho dado." (Números, 20:12)

Tal punição não se registrou nas sagradas (haha) escrituras ao profeta Eliseu por seu caráter infanticida. Ou o livreto é mal documentado ou pobre do Moisés que desejou tirar água de uma rocha à força, antes houvesse se divertido às custas da criançada local.

No mais, parabéns pelo blog, Paulo.

Leonardo Nascimento da SIlva disse...

É, cara!
Sim, a ira recai sobre o agente.

A justiça de Deus não é como a justiça dos homens! Não pense que isso muitas vezes não é conflitante para mim!
Muitas vezes ponho em cheque tudo isso também. Mas acredite, princípios espirituais nunca serão entendidos e discernidos por mente humana. Você, como bom conhecedor da Bíblia, sabe que o que é espírito é discernido pelo espírito.
A minha mente ainda é humanista e moldada segundo o padrão desse mundo. E, ainda assim, o Espírito Santo - o outro Parakletos, segundo Jesus - tem me convencido, a duras penas, da Grandeza desse Deus. E eu já lutei muito contra tudo isso. Só que não dá mais! Quando Deus se revela com Sua grandeza, não há como fugir - vide apóstolo Paulo e tantos outros.

É engraçado que eu sempre fiz esse discurso anti-bíblico! Hoje, começo a enxergar as coisas de um modo diferente. E, tenha certeza, não sou um alienado enganado por pessoas que querem meu dinheiro! Rs!

Além do mais, por mais que a justiça de Deus nos pareça medonha, Ele sempre nos oferece
o escape. Alguns dizem: "o Senhor é meu pastor e me ama como eu sou". Sim, é verdade! Mas eu gosto de complementar: ... e me ama como eu sou, mas não me deixa como estou.


sei que pessoas intelectuais sempre lêem declarações espirituais
com um enorme preconceito! sinceramente, isso não muda o que eu penso!

E acho que o mais legal aqui é levantar a bandeira do respeito ao próximo, né? Já que foi esse o motivo do post do Paulo!

Anônimo disse...

Exato. Respeito pelo outro.
Quando isso faltar, pode deixar que eu intervenho com perspicácia rs

Afinal, sou o mod.
Abs.